O Sete

 
Há um ditado popular que diz: “nunca digas que estás bem”.


E foi isso que aconteceu ao amigo Joaquim, que estava sossegado no seu remanso dos 79.


Há mais de SETE dias o filho do Delfim alfaiate foi convidado  para ir conviver com os seus conterrâneos que, as senhoras e os senhores que sabem escrever e que possuem imensos leitores


Mas o pior estava para acontecer e que era ele  ter de dizer alguma coisa, mais ainda, com um aviso de tom severo e  solene:  não falar mais de sete minutos!


O aviso seria para acelerar o programa ou para se verem mais cedo do convidado?


Ele, no entanto, aceitou, sem prever no sarilho em que se estava a meter. Pensou, voltou a pensar, e lá se atirou para o teclado do computador, mas sempre com o credo na boca e com o SETE sempre apontado para as suas fragilidades literárias.


Contou os sete dias da semana e verificou que os sete minutos teriam de ser bem argamassados e espremidos e logo num dia anterior ao 7º. dia da semana, dia primeiro do sexto mês, que, como se sabe,  é prenunciador da chegada do sétimo.


Mas, há que ter receio desta baralhada que o sete provoca!


Entretanto, ajudado pelo riscar da vida, começou a chegar à conclusão que não era assim tão difícil andar à volta do sete, pois desde os seus primeiros momentos de vida fora mantido  sete meses no ventre de sua mãe.


Nasceu antes do tempo. Tal como o Churchil (convém dar esta nota para valorizar o autor).


Ao menos isso.


E tudo começaria aí.


Não aconteceu no dia 7, mas no 3x7 do mês de Abril.


Assim, o 7 o perseguiu nos primeiros tempos da vida.
Até nasceu no 147 da Brito e Cunha a menos de 700 metros do mar.
Uma maré cheia de setes.


Como tinha nascido sem estar pronto para tal, esteve quase SETE meses entre botijas de água quente e algodão em rama.


Lá estava o SETE a marcá-lo, e marcou-o até hoje.


A 7 de Outubro foi aprender as primeiras letras e a 17 do 7, quatro anos depois, prestou provas de que sabia ler e escrever.


A 7 de Junho disseram-lhe que não servia para a tropa. A ele e a sete amigos.


Aos 17 anos de vida começou a trabalhar até às 7 horas da tarde e depois a estudar à noite, tomando o 1 para apanhar o 17 no Castelo do Queijo para a Praça da Batalha..


Conheceu a menina dos seus olhos a 7 de Janeiro e durante 7  anos fizeram quase um oito, quanto ao que respeita às andanças e contradanças do amor. Ela nascera em 1937.


Beijos e abraços. Risos e amuos. Até ao sim.


Tem graça, o Amor precisa de duas doses reforçadas de letras para ultrapassar o SETE, mas é bom que assim seja, porque resulta, normalmente, num delicioso OITO.


Voltando atrás, casou a 27 de Maio. O padre Alcino, que o casou, não tinha 47 anos, quase 48.



O casalinho foi residir para o 237 duma bonita rua de Leça da Palmeira.
A noite de núpcias foi uma noite de SETE fôlegos, a pedir meças ao destemido 007.


E passados poucos anos lá em casa já havia sete pessoas.


O SETE continuaria  a acompanhar a vida de todos.


Para variar, para dar um certo ar erudito ao autor, ele aponta o SETE da  7ª. Arte, antecedida pela Música, Pintura, Escultura, Arquitectura, Literatura e Coreografia., isto, ainda, a par das sete maravilhas com a Pirâmide de Gizé, Jardins Suspensos da Babilónia, Farol de Alexandre, Colosso de Rodes, Mausoléu de Halicaman, Estátua de Zeus em Olímpia e Templo de Artémis em Éfeso.


Bem, isto já é pretensão de     querer ser um intelectual. O que na verdade não é chinelo para o pé do Joaquim..


O autor cai num PINTAR O SETE que  não dá para tirar sequer a prova dos nove do que pretende dizer. Está metido numa camisa de sete varas, perdão, a camisa tem 12 varas.


É de ficar baralhado.


Mas     que se fechem os olhos à vergonha e continuemos.


Os sábios, os que sabem e não os que impingem uma sabedoria de loja de chinês, mostram à evidência que a Filosofia também se intromete com o SETE, tantas são as suas virtudes:




A Esperança
A Fortaleza
A Prudência
O Amor
A Justiça
A Temperança e
A Fé


Bem, mas sem ocultar,  os pecados mortais que, por coincidência, são também SETE e andam por aí bem espalhados nos tempos que passam.


A Vaidade
A Avareza
A Ira
A Preguiça
A Luxúria
A Inveja e
A Gula.



Mas as virtudes também são SETE. Pois são.


A Castidade
A Generosidade
A Temperança
A Diligência
A Paciência
A Caridade e
A Humildade.



E até temos as sete cores do arco-iris:


Vermelho
Laranja
Amarelo
Verde
Azul
Anil e
Violeta.



Francamente, o que havia de dar ao SETE!


Esta prosa está mesmo a tornar-se numa lenga-lenga.


E nem sequer ainda batemos as teclas das sete notas musicais, retinindo o dó no pensamento daqueles que estão a ser martirizados pela audácia deste autor se meter por sete caminhos.





Sem estilo e sem vergonha. Um autor  de sete e meio.  


Pois, mas deixem o Joaquim espalhar-se ainda mais um pouco nas teclas do computador.


Ele ainda pretende arranjar oportunidade para recordar o tempo de menino e a Branca de Neve e os seus sete anões: o Atchim, o Soneca, o Zangado, o Feliz, Dengoso, o Mestre e o Dunga, que pintavam o sete..


Raio de coisa! Ó Joaquim, já chega!


E agora: não aparece a porta de saída.


Ó sete, sai da frente. Vê se apanhas o ponto final.


Há o receio, evidente, que já foi pisado sete, o pico e o oito e tal.


Por isso, feche-se a conversa a sete chaves.


Mas, esperem, há uma surpresa que valerá vários setes. Os 27 escritores que aqui estiveram merecem isso.


Por isso, o Joaquim foi pedir a ajuda ao inesquecível Zeca Afonso, para nos falar das sete fadas que o fadaram. Sete fadas. E com 337 letrinhas.









Ora, escreve e canta ZECA:


Sete fadas me fadaram
Sete irmãos m’arrenegaram
Sete vacas me morreram
Outras sete me mataram


Sete setes desvendei
Sete laranjinhas de oiro
Sete piados de agoiro
Sete coisas que eu cá sei


Sete cabras mancas
Sete bruxas velhas
Sete salamandras
Sete cega-regas


Sete foles
Sete feridas
Sete espadas
Sete dores
Sete mortes
Sete vidas
Sete amores
Sete estrelas me ocultaram
Sete luas, sete sóis
Sete sonhos me negaram
Aqui d’el rei é demais!


E, pode-se, finalmente, respirar fundo. Chegamos ao fim.


Os SETE minutos já lá vão.  As  palavras jorraram  pelas sete bicas do minguado saber do autorr.


Um verdadeiro diabo a sete este bocadinho de vida.


O tema escolhido pelo autor,  era mesmo um bicho de sete cabeças. Foi uma rasteira que pregaram ao Joaquim.


Onde já onde vão os sete minutos a que se obrigou?


Com jeito chegávamos aos 77.


No entanto, mesmo com o confrangimento que se vê nas vossas caras,  não custa confessar, que o autor aspira voltar aqui, para o ano, com 80 já feitos, isto é, depois de já  ter despachado 10 setes.!


E talvez amparado a uma bengala parecida com um sete.


Não gostaram do que ouviram?
E tem razão para tal. Isso percebe-se nos vossos olhos de misericórdia.


Esperavam outra coisa. Mas, repetimos, a culpa foi do sete que obrigaram o autor a cumprir. O tempo do tema multiplicou-se.


Morreu a intenção. Matamos o SETE.


Sem sentido do ridículo pintamos o sete de diabruras no sentido das palavras; pusemos quem nos ouviu a procurar compreender tiradas incompreensíveis; causou-se indiferença e muitos olharam para o tecto; provocou-se escândalo ao trazer um texto destes para este Encontro; houve desordem nas palavras, nas linhas e entrelinhas.


Uma vergonha!


Mas, já agora, perdido por sete, perdido por setenta, o Joaquim quer redimir-se, pedir perdão a quem aguentou estes enormes sete minutos, trazendo para ponto final, os Sete Erros apontados pelo grande Mahatma Gandhi:


E eles são:


Riqueza sem trabalho;


Prazer sem consciência;


Conhecimento sem carácter;


Ciência sem humanidade;


Comércio sem moralidade;


Adoração sem sacrifício;


Política sem princípio.










Chegamos à última página.


O autor certamente que conseguiu ser perdoado.


Mas nunca mais aceita nem sete, nem setenta minutos.
JOAQUIM QUEIRÓS